
A menina está no espelho e se olha, mas não gosta do que vê. Queria ser outra. A moça da revista. Não exatamente aquela, mas uma que não existe. Existe nela mesma, na verdade. Mas é outra.As mãos no rosto são um pouco de desespero.De querer arrancar algumas coisas e entender onde foi o que já esteve lá. Não tanto do reflexo.
Do reflexo a menina gosta. Mas do que está dentro dele.É o que há dentro do espelho que incomoda. Incomoda, não. Perturba, angustia, inquieta. Por quê, ela pergunta? Por quê?Por que, de repente, essa solidão blindada, esse vazio silencioso, esse frio? Ela é MENINA, não entende.
No chão o lápis de olho, o batom. Mas não para se pintar, porque isso ela só faz quando há palco. Para escrever no espelho. Para tentar pintar a vida. Para rabiscar o que ela não decifra mais em si, nos outros, em Deus. A escova e o pente são para rasgar a pele e empurrar os nervos de volta pra dentro.Porque esse à flor da pele machuca, arrebenta, destrói. Se a cabeça ainda, dói. Dói muito. Dói tudo aqui. A boneca está morta. A menina matou a boneca. Matou a boneca de tanto carinho que quis dar.
Tentou colocá-la dentro do espelho para ter companhia. Ela bateu com a cabeça, forte demais, seguidas vezes, e morreu. A menina tentou ressucitá-la, mas não teve jeito, não.Ás vezes as coisas não tem solução e a gente precisa entender.Mas ela é menina,não entende. Então chora...